terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Exotizar e ser exotizado

Tenho de conversar com mais brasileiros para saber se é apenas impressão minha ou se realmente rola um estranhamento dos portugueses perante nós. Bem, CLARO que eu sei que isso é natural e o diferente chama a atenção. Mas pensem comigo: o que não falta é estrangeiro neste país, brasileiro, então, nem se fala.

Estudar antropologia tem me ajudado a ver o mundo com outros olhos, ainda não tenha a certeza se constitui um treino às observações etnográficas, como se tudo isso aqui fosse uma pesquisa de campo [o que, de certa forma, não deixa de ser].

Vamos ao fato:

tenho conversado muito com Amanda, minha amiguinha brasileira e antropóloga e colega de sala-e-esclarecedora-oficial-da-pessoa-que-vos-fala-sobre-as-ciências-sociais acerca do modo como nos sentimos observados e analisados aqui, sobretudo, no contexto universidade/sala de aula.

Ok, trata-se de uma turma de antropólogos sedentos pelo exótico, mas que é estranho sentir-se nesse papel tão diretamente, isso é! Tento dizer que:

1) sim, é muito estranho se sentir colônia. Uma coisa é estudar na escolinha/faculdade que fomos colonizados pelos portugueses e tudo que está relacionado ao fato (que me revolta mais do que anima, para ser sincera) estando em nosso contexto, nosso país etc.; outra é estar em sala de aula portuguesa e ouvir falarem de Cabo Verde, Macau, Angola e Brasil como ex-colônia e locais exotizados, diferentes, sermos tratados (num contexto clássico e desatualizado, não empregado atualmente, da antropologia - e quero dizer que se trata apenas de uma exemplificação) como povos tribais ou simples e etc.

2) mais estranho ainda, e até achava que era mais uma de minhas nóias, é sentir que cada palavra que você profere ou cada gesto exagerado (falo de mim, um traveco enrustido!) ou piadinha infame é visto de modo minucioso, como se todo detalhe tivesse de ser analisado e avaliado para que o comportamento e relações sociais dos brasileiros possam ser sintetizados ou montados em um esquema mental. Exagero? Bem, pode até ser, mas não é uma impresssão apenas minha, como falei anteriormente.

Posso estar enganada, mas hoje percebi isso mais claramente [e gostaria de dividir com vocês] e afirmo ser uma pena não ter discutido isso com Amanda antes, o que me faria ver mais a fundo com olhos de investigador social.

Estávamos a ter uma aula sobre Simbolismo e Ritual e em determinado momento a aula foi interrompida porque houve dúvidas quanto ao significado de empatia, antipatia e apatia. Para mim é tudo muito claro, assim como para vocês brasileiros, certo? Costumo usar esses termos constantemente assim como ouço muitos amigos e parentes falarem.

Por um momento achei que fosse bobagem, até que a interrupção ocorreu em outro momento da aula e tomei a palavra para explicar o significado de cada um. Percebi que um colega, especificamente o que lançou a questão, ouviu-me com respeito, mas acredito que com certo incômodo.

Voltei a discutir o uso dos termos com uma colega que estava sentada próxima e que acabou por me confessar que tais palavras não são usados em contextos relacionais, digo, com pessoas.  
EX. Tenho antipatia por fulaninho ou eu e cicrano mantemos uma relação de empatia mútua, ou ainda, beltrano é apático para a vida.

Falei que agora entendia a razão para a discussão e que, ao contrário do que ocorre em Portugal, no Brasil usamos bastante nesse contexto e por isso para mim era tão óbvio o uso das palavras e seus significados; e que ocorria o contrário com os portugueses, que, como ela infrmou, não costumavam fazer uso dos vocábulos [não necessariamente com essas palavras].

Minha colega fez cara de brava [de brincadeira] e olhou-me falando algo parecido a "estás a falar mal de nós?". Brincadeira ou não, senti incômodo da parte dela e do outro coleguinha que citei anteriormente -  aquele que me olhou com respeito e incômodo. A sensação que tive é que, por ser o português língua materna deles e que nos foi "dada", eles teriam mais direito de saber do significado que eu.

Não sei se conseguem entender o que fato, mas ser exotizada all the time, ou quase todo o tempo, é meio estranho. Consola-me o fato de saber que cada dia ou cada contato é uma observação. Sim, estar aqui tem sido um ótimo exercício etnográfico.

Beijinhos, como diriam os portugueses! haha

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